Em Lisboa, Delícias de Goa



José Paula passa os dedos com ternura pelas folhas manuscritas do caderno acabado de pousar sobre a mesa. Nasceu-lhe um sorriso tímido, decerto relembrando os dias bons em que foram preenchidas, pela mão da mulher, há muito ausente. Quanto mundo percorrido, senhor José, desde a saída da Goa natal, no rescaldo da expulsão da administração portuguesa!


(Nota para os jovens posteriores à minha geração, dispensados de estudar, do Minho a Timor, as idiossincrasias do Império português: Goa foi um território, localizado no subcontinente indiano, sob administração portuguesa, entre 1510 e 1961. É natural que, quando perante a gastronomia de Goa, nos assalte um permanente dejá vu de sabores, aromas, memórias: eu já provei isto, mas onde?)


O espaço é um achado, numa sobreloja virada para uma rua calma na cidade que anoitece, abandonada. A decoração enternece, feita com um amor sem exigências pelo antigo território português. É um amor de saudade, que também é nosso. É um amor nosso, que nos toca a saudade.


Distinguido com 1 Garfo  na 7ª edição do concurso Lisboa à Prova, foi considerado pelo juri “uma referência quando se fala de restaurantes goeses em Lisboa”.


Recomendado por uns, convidados por outros, lá fizemos uma visita recente, daqui deixando as impressões.

"Começámos por ter cozinheiros goeses, mas eles gostavam muito de ir de férias e ficar dois, três meses...", diz-nos José Paula Rodrigues, proprietário, restaurador, apaixonado pela terra Natal. "Este é o caderno de receitas de minha mulher, que me serviu de mestre e ao meu filho...". O filho, é hoje o cozinheiro do restaurante - e, se a aposta era alta, os resultados aparecem mais que satisfatórios, como pudemos comprovar.

Para começar, umas chamuças delicadas, bem fritas, de recheio saboroso e, ao contrário da prática lisboeta, pouco picantes.


"A cozinha goesa não é muito picante, ao contrário da região envolvente. Teve de se adaptar aos portugueses..." (José Paula)

Os camarões tigre realçados pela salada de couve e tomate, acompanhamento típico da região.




O Caril de garoupa trazia um aroma de encher a casa.


O Balchão de porco, herdado de Macau "cubos de carne marinados que passam pela frigideira, envolvidos depois num tempero com extracto de camarão antes de irem a cozer…num molho catita" que caiu bem (excepto no registo fotográfico, que tremeu até à impossibilidade de recuperação).

E o Sarapatel... Ai, se esta casa só tivesse um prato, e se o prato fosse este, continuaria a ser a mais interessante casa de Goa a ser visitada, por miríades de gulosos, desvairados, apaixonados, gastrónomos!


Este sarapatel goês, perfeita combinação entre a textura da carne e o sabor do molho (que conjuga a frescura do gengibre e do vinagre, a terra do cominho e do cravinho, o doce da canela...), une o melhor dos dois mundos, os "miúdos" portugueses, as especiarias do sul indiano e foi o culminar de uma noite de redescobertas.



Terminando com a boca doce, a Bebinca não deixou os créditos em mãos alheias,


assim como um refrescante e repousante gelado de manga.


É de ir e repetir. (E ainda ficaram por provar, os Biryani, o Chacuti, o Vindalho, o Chouriço à Goesa; o Doce de Grão, o Jilebi, o Alebelé...)  

Restaurante Delicias de Goa
Rua Conde Redondo, 2-D Lisboa
Telef.: 210 504 986
Almoços: 12H00 – 15H30 ; Jantares: 19H30 – 22H30
Encerra Domingo ao Jantar e Segunda-Feira todo o dia
Lugares: 50 Levar Crianças: Sim

Comentários

JP disse…
Bom artigo. Gosto do restaurante e concordo com o que escreve.

No último ano..