Culinária de Lisboa #25 - Filetes de Peixe em Molho de tomate

Querida Mô,


Nas minhas caminhadas pela cidade, mandatórias já que continuo a manter altos os níveis de todas aquelas análises que regularmente me obrigam a fazer, passo muitas vezes por um dos últimos prédios das avenidas novas que mantêm a dignidade original. Não o demoliram nem o embalsamaram com novas entranhas de betão, não se esqueceram de o cuidar nem de o manter ocupado. Teve a sorte de nascer sob a conjugação certa de arquitectura, donos, inquilinos! Numa zona em avançado estado de terceirização, continua maioritariamente habitado. 


Av. Alexandre Herculano, 25, Prémio Valmor 1991
(Autor: não identificado ;  fonte: Arquivo Fotográfico de Lisboa)
Quero crer que o psicólogo que, diligente, perto da botoneira cravou uma discreta e polida placa, o use como a personagem de Nani Moretti no Quarto do Filho, partilhando casa e consultório - seria bonito e de um inequívoco bom gosto. Aquela placa fascina-me, várias vezes senti a tentação de tocar, subir e bisbilhotar. Não o fiz - ainda... - porque tenho a certeza que capitularia perante a óbvia pergunta, marcando uma consulta. Poderia telefonar a desmarcar mas isso seria tão... folhetinesco? Não. Marcaria a consulta e voltaria a aparecer no dia e hora combinados, cordeiro para o sacrifício, resignado ao descascar emocional a que seria obrigado. 


Uma sessão de análise é como o desmonte de um peixe: vai-se retirando tudo o que não interessa, pele, espinhas, cabeça, barbatanas, até se chegar ao filete, esse pedaço de perdição que justifica todo o animal. Ora eu não quero ser um filete, por mais que deles disfrute! Quero-me assim inteirinho, completo com as minhas camadas de pele, as espinhas que podem engasgar, a cabeça bela ainda que só mesmo dada a conhecedores!


E, a partir daí, quem me alimentaria de mistério nestas caminhadas? O prédio já não, transformado, ao meu desvendado senso, num lupanar trágico, lugar onde, desnudo e contrariado, perdera a minha inocência.


Ná. Filetes sim, mas só no peixe.


FILETES DE PEIXE EM MOLHO DE TOMATE

1 kg de filetes de pescada / peixe-galo / pargo / linguado / pregado / rodovalho ; 0.5 kg tomate; 2 dl vinho branco; 2.5 dl água; 150 gr. manteiga; 2 cenouras; 1 ramo salsa; sal, pimenta e louro.

O caldo: Faz-se um caldo de peixe com espinhas, cabeça e pele, as cenouras às rodelas, 1 cebola, salsa, sal e pimenta, deixando ferver durante 1 hora.

O peixe: Cozem-se os filetes no forno, com 4 colheres de sopa do caldo e 50 gr de manteiga. Bastam 8 minutos. Reduz-se o caldo da cozedura com o restante caldo de peixe até 1.5 dl.

O molho de tomate: Refogam-se os tomates com a cebola, salsa e manteiga em lume brando até desaparecer o líquido. Rectifica-se a acidez com um pouco de açúcar.

O final: Numa travessa, colocam-se lado a lado o peixe e o molho de tomate, cobrindo-se com o caldo e o resto da manteiga. Vai ao forno 5 a 6 minutos.

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