A lógica da batata

Há uns anos foi feito um spot publicitário já não sei a que coisa que mostrava um cliente a ser envolvido por uma turma em festa (banda, confetti, serpentinas) assim que escolhia o produto publicitado.

Eu defendo o mesmo procedimento de cada vez que se der um pequenino passo na direcção de um maior protagonismo dos produtos nacionais nos expositores das grandes superfícies.

Desde já pecador me confessando (que a vida se revela às vezes um pouco mais curta do que o nosso desejo) assisti com emoção à disponibilização, num desses espaços, de batata nacional com promoção centrada na sua origem - "BATATA DE TRÁS-OS-MONTES" que, como todo o país sabe, tem Indicação Geográfica Protegida - e onde se referia igualmente a variedade - "Kennebec".

Nada do "para fritar" ou "para cozer" habitual. É um marco.

Bom... um marquinho, já que teria sido interessante explicar um pouco mais - origens, características, sugestões de preparação que lhe realce aquelas (eu sei que a esmagadora maioria dos consumidores estará muito mais preocupado com os cortes e não-cortes do presente mas, caramba, é assim que funciona a pedagogia, não é? - dar ao doente o medicamento mesmo que este não o queira tomar).

Como por aqui também se tenta contribuir para a elevação da nossa cultura gastronómica, eis algumas pistas.




"As características da Batata de Trás-os-Montes, designadamente as sápidas e as aromáticas, estão intimamente relacionadas com a área geográfica de produção. Estas características devem-se às condições climáticas da região que, em conjunto com o saber fazer, nomeadamente escolha de variedades, técnicas de cultivo, das quais se salientam a estrumação das terras e as sachas, estado de maturidade na apanha e condições de armazenamento (temperatura e duração) conferem à batata de Trás-os-Montes um sabor adocicado (relação açúcar/amido) e uma textura ideal para "absorver" os gostos dos molhos dos pratos com carnes gordas (porco) base da gastronomia da região e "cortar" o excesso de gordura de tais pratos tradicionais. São estas características, facilmente perceptíveis e reconhecidas pelos naturais da região e pelos consumidores habituais, que têm que ser assinaladas através da rotulagem e da marca de certificação para que os restantes consumidores as possam
reconhecer.


A produção de batata de qualidade - adocicada, gostosa e aguentando muito bem a cozedura, sem se desfazer - assegurada pelas condições edafo-climáticas únicas da região e pelo saber-fazer das populações, constitui uma actividade viável em termos económicos, que muito pode contribuir para a manutenção das populações rurais e que mantém o equilíbrio com as condições agro-ecológicas da região.


Em Trás-os-Montes a batata aí produzida é por tal forma apreciada que muitas vezes é considerada como elemento principal do prato ou refeição, sendo a carne, o peixe ou as hortaliças, meros acompanhantes da excelente batata.


A batata é base de sustentação de grande número de pratos transmontanos, ainda que, como todos os bons produtos, se apresente simplesmente cozida em água e sal. O sabor adocicado decorrente da elevada presença de amidos - consequência natural da cama quente das terras bem estrumadas e sachadas - é muito apreciado para contrastar e "cortar" o sabor das carnes e enchidos transmontanos, algo gordos e pujantes de sabor.


A presença da Batata de Trás-os-Montes é requerida em todos os pratos da gastronomia tradicional, designadamente no "Cozido Barrosão" e no "Cozido Transmontano", mas também para acompanhar uma simples Alheira (de Barroso, de Boticas, de Vinhais ou de Mirandela, por exemplo) grelhada ou uma posta Mirandesa, Maronesa ou Barrosã, um assado de Carne de Porco Bísaro Transmontano ou, ainda, acolitando Cordeiros ou cabritos, em assados simples, mas cheios de sabor.

(in BATATA DE TRÁS-OS-MONTES - INDICAÇÃO GEOGRÁFICA PROTEGIDA, Caderno de especificações, 2005


Algumas sugestões mais:

1. Cortar em gomos. Assar até cozidos, pintar com azeite, polvilhar com um pouco de piri-piri e farripar com queijo. Retornar ao forno para alourar.

2. Cortar no sentido longitudinal.  Fazer cortes em cruz em toda a superfície de corte. Pintar com azeite, polvilhar com alho em pó. Assar até dourar. Servir com peixe grelhado ou frango assado.

Comentários

Apoio totalmente, Pedro. Dar essa informação sobre os produtos não custa assim tanto e já agora aprendemos mais qualquer coisa. Ficamos todos a ganhar, produtores, consumidores, e também os vendedores (eu sei que as pessoas compram de qualquer maneira, mas se calhar algumas vão preferir o sítio onde ficam a saber mais, não?)
Pedro Cruz Gomes disse…
Exactamente, Alexandra. Nos tempos em que comerciar alimentos não era uma desculpa para o negócio finaceiro, era assim que os empreendedores conquistavam a clientela.

No último ano..