Masterchef
Masterchef ou uma bedtime story contada às crianças e ensinada ao povo.
"As pessoas comuns nunca irão compreender a nossa arte", ladrou o grande Chef à sua brigada de ansiosos jovens cozinheiros. Ninguém reparou em Lorenzo, que se tinha esgueirado para o fundo da sala quando era suposto estar a descascar alho e a retirar sementes aos chillies. "O meu menu, elegante e intelectual, serve dois propósitos - desencoraja os ignorantes de entrar neste lugar reverenciado e é um testamento às minhas proezas!".
A inteira brigada trabalhava de graça, feliz por ser paga em sabedoria pelo Chef Legross - sabendo também que, seis meses passados, poderiam ter a colocação que quisessem em qualquer restaurante do país. Um começou a preparar uma terrina de foie gras e carapau ligeiramente fumado em aspic, outro o prato de assinatura "espuma lunar" que a iria adornar. Um terceiro começou a desidratar caudas de lagosta para ser pulverizadas e servidas com uma palhinha, a seca crítica de Legross aos excessos modernos. Legross recolheu-se no seu escritório em reflexão, com um cálice de brandy, enquanto a sua filha Délice supervisionava toda a preparação com olhos inexpressivos.
Lorenzo estava longe da remota aldeia de montanha que era a sua casa. Tinha saudades dos guisados da sua mãe, dos seus bolos e da sua pasta, mas queria muito aprender com o seu Mestre. O seu olhar arregalado seguia os outros enquanto tentava decifrar o que faziam e, mais importante, porquê? Lorenzo nunca tinha visto comida deste calibre e não conseguia compreender. Com o coração nas mãos, sussurrou, "Desculpe, Chef?". Ignorado, repetiu, desta vez mais alto, "Chef Legross!"
"O que é que tu queres?", chegou a tensa resposta.
"Desculpe, eu estou aqui só para compreender. Porque é que a sua estimada clientela haveria de querer inalar uma lagosta?"
Legross virou-se, tão vermelho como a própria lagosta. "Seu italianito nojento! Como é que te atreves a questionar-me ou ao gosto dos teus superiores que conseguem apreciar a minha arte? És pouco mais que um feto! Vai-te - não quero voltar a ver a tua cara!"
Lorenzo voltou para casa e durante três dias, atrás das cortinas corridas, afundou-se na mágoa de contemplar o fim prematuro da sua carreira. Foi surpreendido por uma batida na porta. Era Délice, linda mesmo na penumbra do vestíbulo. Trazia uma pequena caixa na mão - "Um presente do meu pai", disse com um olhar de desculpa.
Lorenzo desatou o laço dourado, revelando-se uma cabeça de alho e dois pequenos e já secos chillies. O cartão que acompanhava dizia apenas "O teu futuro".
Délice começou a chorar silenciosamente. Lorenzo, gentilmente, fê-la entrar. Limpou-lhe as lágrimas, colocou uma panela com água ao lume, tão salgada quanto aquelas. Cozeu spaghetti, escoou-lhe a água e temperou-o com os rancorosos alho e chillies, um pouco de azeite e nada mais.
Comeram juntos o aglio e olio sem falar. Délice recomeçou a chorar enquanto comiam - nunca tinha experimentado nada tão delicioso, comida que alimentava o corpo e a alma em vez do intelecto e do ego, comida feita com mais amor do que técnica. Inclinou-se sobre a mesa e os seus lábios, brilhantes pelo azeite e picantes pelo chilli, beijaram Lorenzo em silêncio"
in "BOCCA COOKBOOK" Jacob Kenedy
A inteira brigada trabalhava de graça, feliz por ser paga em sabedoria pelo Chef Legross - sabendo também que, seis meses passados, poderiam ter a colocação que quisessem em qualquer restaurante do país. Um começou a preparar uma terrina de foie gras e carapau ligeiramente fumado em aspic, outro o prato de assinatura "espuma lunar" que a iria adornar. Um terceiro começou a desidratar caudas de lagosta para ser pulverizadas e servidas com uma palhinha, a seca crítica de Legross aos excessos modernos. Legross recolheu-se no seu escritório em reflexão, com um cálice de brandy, enquanto a sua filha Délice supervisionava toda a preparação com olhos inexpressivos.
Lorenzo estava longe da remota aldeia de montanha que era a sua casa. Tinha saudades dos guisados da sua mãe, dos seus bolos e da sua pasta, mas queria muito aprender com o seu Mestre. O seu olhar arregalado seguia os outros enquanto tentava decifrar o que faziam e, mais importante, porquê? Lorenzo nunca tinha visto comida deste calibre e não conseguia compreender. Com o coração nas mãos, sussurrou, "Desculpe, Chef?". Ignorado, repetiu, desta vez mais alto, "Chef Legross!"
"O que é que tu queres?", chegou a tensa resposta.
"Desculpe, eu estou aqui só para compreender. Porque é que a sua estimada clientela haveria de querer inalar uma lagosta?"
Legross virou-se, tão vermelho como a própria lagosta. "Seu italianito nojento! Como é que te atreves a questionar-me ou ao gosto dos teus superiores que conseguem apreciar a minha arte? És pouco mais que um feto! Vai-te - não quero voltar a ver a tua cara!"
Lorenzo voltou para casa e durante três dias, atrás das cortinas corridas, afundou-se na mágoa de contemplar o fim prematuro da sua carreira. Foi surpreendido por uma batida na porta. Era Délice, linda mesmo na penumbra do vestíbulo. Trazia uma pequena caixa na mão - "Um presente do meu pai", disse com um olhar de desculpa.
Lorenzo desatou o laço dourado, revelando-se uma cabeça de alho e dois pequenos e já secos chillies. O cartão que acompanhava dizia apenas "O teu futuro".
Délice começou a chorar silenciosamente. Lorenzo, gentilmente, fê-la entrar. Limpou-lhe as lágrimas, colocou uma panela com água ao lume, tão salgada quanto aquelas. Cozeu spaghetti, escoou-lhe a água e temperou-o com os rancorosos alho e chillies, um pouco de azeite e nada mais.
Comeram juntos o aglio e olio sem falar. Délice recomeçou a chorar enquanto comiam - nunca tinha experimentado nada tão delicioso, comida que alimentava o corpo e a alma em vez do intelecto e do ego, comida feita com mais amor do que técnica. Inclinou-se sobre a mesa e os seus lábios, brilhantes pelo azeite e picantes pelo chilli, beijaram Lorenzo em silêncio"
in "BOCCA COOKBOOK" Jacob Kenedy
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