Gastroescritas #10 - The Man Who Ate the World

Vale a pena, do ponto de vista gastronómico, frequentar restaurantes de topo?

Vale a pena, numa cidade visitada, procurar os restaurantes de topo, como forma de descobrir a melhor oferta gastronómica do país?

Vale a pena uma dieta de uma semana de restaurantes de topo?



Jay Rayner, crítico de restaurantes do The Observer procurou responder-se a estas questões (enquanto nutria outras, mais pessoais - mais morais - como a da relevância de escrever sobre refeições milionárias no contexto de um mundo faminto e de crise económica quase global) durante um auto-proporcionado mini-tour por algumas das cidades mais pujantes em termos de restauração de topo.

(Deixem-me ser mais claro: por algumas das cidades mais gastronomicamente novas-ricas do mundo intercaladas por algumas das mais tradicionalmente ricas).

Los Angeles. Moscovo. Dubai.

Tóquio, Nova Iorque, Londres, Paris.

O resultado não foi globalmente muito bom, o que não me admira por aí além, uma vez que o autor optou, a maior parte das vezes, por procurar as multinacionais Michelin, em detrimento de projectos nacionais, talvez menos glamorosos, eventualmente mais genuínos, mais próximos de oferecer o que o subtítulo do livro caracteriza como um "perfect dinner". Não foi bom o resultado mas as conclusões que as diversas refeições proporcionaram, valeram o livro que merece ser lido. Porquê frequentar sucursais de restaurantes dos chefs mais reconhecidos? O que leva os clientes aos restaurantes de topo e, inversamente, o que têm os restaurantes de topo a oferecer aos seus clientes?

("Não tenho dúvidas de que o efeito alcançado pelos três-estrelas parisienses - e pelos restaurantes de topo em geral - deve pouco à comida e muito aos complementos. Atire-se com ouro suficiente às paredes, pendurem-se cristais suficientes no tecto, empreguem-se bonitas criaturas de vinte e poucos anos em número suficiente para cuidar de todas as suas necessidades e segui-lo até à casa-de-banho e, se fôr executado com suficiente profissionalismo, a maior parte das pessoas considera-la-à uma noite bem passada mesmo antes de ter começado a comer.")

É claro que houve excepções. Como as refeições em quase secretos locais de comer de Tóquio.

("(...) encontramos a entrada. É um elevador vermelho num pequeno, anónimo, edifício de apartamentos de seis andares. Parece um daqueles lugares onde uma mulher com gatos a mais possa viver uma vida de calmo desespero. Apanho o elevador para o terceiro andar e descubro que não é nada disso. Não existe uma velha mulher. Não há gatos. Pelo contrário, descubro o paraíso da comida. É o restaurante no final do universo. É a delícia em dezassete pratos. Encontrei o caminho para o Yukimura. (...) Apresentam-me a conta de 37,000 yen (cerca de 155£) e coloco o cartão na brilhante bandeja lacada, convencido de ter sido uma pechincha. (...) É provável que tenha acabado de comer a refeição perfeita."

Ou, em Paris, numa semana louca de sete refeições em restaurantes 3 estrelas Michelin em  sete dias, a confirmação do L'Astrance (chef Pascal Barbot).

(Do site do restaurante. Copyright - L'Astrance)

("Não tem porteiros em libré. Não tem paredes com aplicações de folhas de ouro como se o rei Midas tivesse tido uma hemorragia nasal. Não tem brigadas de empregados, ninguém que se apresse a apanhar o seu guardanapo se o deixar cair, ninguém que o siga até à casa-de-banho. (...) it was all about food")

Ou, quando fugindo à regra do ouro, decide seguir a sugestão de Mario Batali que, quando questionado sobre o lugar ideal para uma quinta-essencial experiência restaurativa em Nova Iorque, lhe indicou uma sandes de pastrami no Katz's Deli da Houston Street.

(Ah. I'll have what she's having.)


(Katz's Deli, Meg Ryan e Billy Cristal em When Harry Met Sally)
BSO - Old jazz classics com Harry Connick Jr. - ouvi-la é um belo exercício de gosto)
 

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