Oxente, tu visse? Pelas terras do Nordeste - Carne de Sol e um óptimo 2016!
Continua tão verdadeiro quanto perene é o seu uso como cartão-de-visita jornalístico: o Brasil reinventa a sua alegria de viver em cada festa do calendário, seja ela o Carnaval, as nordestinas festas Juninas ou a passagem de mais um ano. A virada é ocasião para enviar o mau-olhado para trás das costas, esquecer momentaneamente a galopante crise política e económica e, de branco - por causa da paz - e amarelo - por causa da riqueza -, descer, figurada ou realmente, a avenida principal, com todo o fulgor que a exuberância tropical, o calor de abacaxis e a cerveja estupidamente gelada permitem.
Um bom exemplo dessa transformação do quase penoso em adorável, do precário em prolongado, é o da carne de sol. Carne de sol: "carne salgada e seca ao Sol, servida frita ou assada na brasa, regada com manteiga de garrafa ou adubada com queijo de coalho", segundo a definição do magnífico e por mim agora descoberto, "Arte da Cozinha Brasileira", dicionário de termos gastronómicos brasileiros iniciado por Leonardo Arroyo e completado por Rosa Belluzzo, com primeira edição em 2009. Definição sintética, precisa mas pouco informativa da veneração que todo o nordestino tem por esta criação, filha de necessidade de preservação da indispensável, rareada e cara carne de bovino num sertão padrasto.
Ao contrário do charque ou da carne-seca, mais secas e com teores de sal superiores, esta é uma carne que necessita de refrigeração, com um tempo de vida de prateleira pouco superior ao da carne fresca.
Tão deliciosos quanto o seu sabor, são os variados nomes que a mesma toma, Nordeste fora: carne-de-sertão, carne do ceará, carne serenada, carne-de-viagem, carne-mole, carne-do-vento, cacina, carne acacinada.
Sendo por regra empregues cortes considerados menos nobres - da parte traseira do animal - herda as suas características gustativas que não a dureza: é uma delícia, envergonhando qualquer ortodoxo das zonas do lombo.
Simplesmente grelhada, frita, acompanhada por feijão-verde (frade) - num arrumadinho (*) -, farofa, pirão de leite, macaxeira ou batata doce, tira o sério á vida e faz de cada refeição um recomeço.
E pronto. Ainda com este sabor na boca, vou ali e já venho, desejando-vos um 2016 melhor que a encomenda. 2016 que vos iluminará o sorriso e abrirá o espumante primeiro do que a mim - fica-me a vantagem de o receber mais encalmado.
Saravá!
(*) "Arrumadinho - Feijão-verde cozido e escorrido, refogado em manteiga de garrafa e temperos, charque, linguça, tomate e pimentão picados, misturados com farinha de mandioca e sapicados com coentro picado" ( "A Arte da Cozinha Brasileira"). O autor diz charque mas também se usa, como no caso presente, carne de sol.
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