A Lisboa quase secreta
Estive quase tentado a ensaiar um trocadilho com os palitos que o Tiago Pais andou a meter, com seriedade e pundonor, nos restaurantes pelos quais se apaixonou.
Depois, achei que era óbvio, corriqueiro, bandarilheiro mesmo.
Depois, lembrei-me que o assunto eram os restaurantes populares de Lisboa e que a Lisboa popular sempre foi isso - touradas e fado, rasteirices e malandragem, preparações básicas e sabores fortes, emoções a solta e a mistura certa que o Alexandre O'Neill resumiu genialmente:
(não condiz com esta urbanidade de primeiro mundo que nos gostamos de convencer existe agora, que sempre existiu, com esta qualidade de sabores e de preparações que julgamos estender-se a todas as cozinhas e mercados do país, com este país ex-pobrezinho mas sempre honrado, de pão e vinho sobre a mesa, cheirinho a alecrim e cacho de uvas dourado.)
Bom. Divirjo. Voltemos ao princípio.
O Tiago Pais, jornalista do Observador e um observador talentoso e atento da actividade gastronómica deste país e arredores, percorreu
muitas dezenas de restaurantes populares de Lisboa, com o objectivo de descobrir os melhores e com eles listar a primeira selecção lisboeta de locais tradicionais de merecimento gastronómico.
Vale a pena esclarecer que o autor define oficialmente restaurantes populares como "estabelecimentos modestos que servem refeições de cozinha tradicional portuguesa a preços honestos", ainda que eu prefira a sua alusão oficiosa: uma "casa simples, com azulejos gastos e copos baços" onde se pode "pedir o prato do dia e acabar a roer os ossos, lamber os dedos e a molhar o pão, não necessariamente por esta ordem."
Com esse conhecimento fez um favor à cidade, aos seus cidadãos, aos que nela trabalham e aos que a visitam ao publicar mesmo agora "As 50 Melhores Tascas de Lisboa", um manual de bom uso alimentar e pouco uso financeiro. Lá figuram a Adega da Bairrada e o Maçã Verde, o Stop do Bairro e o Imperial de Campo de Ourique, o Zapata e os Zés - o da Mouraria e o Pinto - para só mencionar os mais destacados,
distinguidos com o "Palito de Ouro" premiação pessoal e intransmissível, mas comungável.
Para lá desta qualidade, faz à cidade o que eu tenho visto negligenciado por quase todos: traz para as bocas do mundo os bairros desensolarados da capital, os que nasceram sem monumento ou museu, avenida chique ou pendor terciário, apenas sendo lugares de pessoas. Como lisboeta de paixão, gostei de confirmar que também há vida na cidade para além do turismo, que ainda há quem trabalhe (bem!) com os lisboetas em mente, em Campo de Ourique, no Lumiar, em Benfica, no Poço do Bispo, em Alvalade, na Penha de França...
De cada restaurante são indicados os pratos mais emblemáticos e os pratos do dia, para além da localização, dias de funcionamento e horários. Traz ainda um mapa a tiracolo para ajudar a planear excursões (vocês sabem lá as voltas que são precisas para chegar ao Poço do Bispo!), uma lista dos restaurantes que servem como prato do dia alguns dos mais emblemáticos pratos da cidade (bacalhau assado, cozido à portuguesa, feijoada), Tem o formato certo para nos habitar o bolso ou a mala e um design que nos deixa prontos para descobrir mais.
A vida não começou nem felizmente acaba nas tascas de fine dining que nos querem fazer acreditar ser o futuro - continuo a acreditar que o futuro não se faz sem dois ingredientes fundamentais, os lisboetas e o passado - o que este livro ajuda a comprovar: apesar das tangentes às normas, das imprecisões decorativas, estes sabores, ai estes sabores que nos reverberam na memória!, estão-nos tão no sangue que perdê-los é uma desgraça e ajudar a mantê-los uma obrigação. Para além de um prazer.
Boa, Tiago. E da cá mais um pastelinho (quando acabarem, bebemos dois copinhos de vinho branco).
Depois, achei que era óbvio, corriqueiro, bandarilheiro mesmo.
Depois, lembrei-me que o assunto eram os restaurantes populares de Lisboa e que a Lisboa popular sempre foi isso - touradas e fado, rasteirices e malandragem, preparações básicas e sabores fortes, emoções a solta e a mistura certa que o Alexandre O'Neill resumiu genialmente:
(...) País amador do rapapé, / do meter butes e do parlapié, / que se espaneja, cobertas as miúdas, / e as desleixa quando já ventrudas. (...)
(não condiz com esta urbanidade de primeiro mundo que nos gostamos de convencer existe agora, que sempre existiu, com esta qualidade de sabores e de preparações que julgamos estender-se a todas as cozinhas e mercados do país, com este país ex-pobrezinho mas sempre honrado, de pão e vinho sobre a mesa, cheirinho a alecrim e cacho de uvas dourado.)
Bom. Divirjo. Voltemos ao princípio.
O Tiago Pais, jornalista do Observador e um observador talentoso e atento da actividade gastronómica deste país e arredores, percorreu
com seriedade e pundonor
muitas dezenas de restaurantes populares de Lisboa, com o objectivo de descobrir os melhores e com eles listar a primeira selecção lisboeta de locais tradicionais de merecimento gastronómico.
(Fonte:editor) |
Com esse conhecimento fez um favor à cidade, aos seus cidadãos, aos que nela trabalham e aos que a visitam ao publicar mesmo agora "As 50 Melhores Tascas de Lisboa", um manual de bom uso alimentar e pouco uso financeiro. Lá figuram a Adega da Bairrada e o Maçã Verde, o Stop do Bairro e o Imperial de Campo de Ourique, o Zapata e os Zés - o da Mouraria e o Pinto - para só mencionar os mais destacados,
ah, os palitos do início do texto
distinguidos com o "Palito de Ouro" premiação pessoal e intransmissível, mas comungável.
(Lá figura igualmente a minha vizinha e lumiarense Castiça)
Para lá desta qualidade, faz à cidade o que eu tenho visto negligenciado por quase todos: traz para as bocas do mundo os bairros desensolarados da capital, os que nasceram sem monumento ou museu, avenida chique ou pendor terciário, apenas sendo lugares de pessoas. Como lisboeta de paixão, gostei de confirmar que também há vida na cidade para além do turismo, que ainda há quem trabalhe (bem!) com os lisboetas em mente, em Campo de Ourique, no Lumiar, em Benfica, no Poço do Bispo, em Alvalade, na Penha de França...
(Fonte: editor) |
(Fonte:editor) |
Boa, Tiago. E da cá mais um pastelinho (quando acabarem, bebemos dois copinhos de vinho branco).
Comentários
- Antiga Casa Faz Frio (frequento regularmente há anos)
- Cantina do Mercado 31 de Janeiro (idem)
- Casa dos Passarinhos (ibidem)
- O Comilão (frequentei muito, há mais de 10 anos que não vou)
- Jaguar (fui muitas vezes, já não vou há alguns anos)
- Stop do Bairro (vou de vez em quando, desde há alguns anos)
- Tasca do Papagaio (vou de vez em quando, é perto de casa)
- Venezuela (fui uma vez há dois anos)
- Zé Pinto (duas ou três vezes muito espaçadas no tempo)
Mas há muito para descobrir.
Acho que Campolide está ainda muito fora dos radares, tenho andado a explorar.