TODOS ao Festival


Em cima da hora e quase telegráfico, para não perderem a oportunidade de visitar um dos eventos com potencial mais interessante do ano. Não tem nomes sonantes, avant-gardes extremas, glamour, sound  ou photo bytes. Parte da vontade de entrecruzar culturas, religiões, modos de ver e decifrar o mundo e usa a gastronomia como uma das possíveis pontes.

Falo do Festival TODOS que está a decorrer na Colina de Santana / Campo dos Mártires da Pátria (os sacrificados à visão amiga dos nossos mais antigos aliados e, na altura, libertadores/ocupantes da pátria) desde ontem, dia 8, até ao próximo dia 11.

"Criado em 2009, o TODOS-Caminhada de Culturas tem afirmado Lisboa como uma cidade empenhada no diálogo entre culturas, entre religiões e entre pessoas de diversas origens e gerações. O TODOS tem contribuído para a destruição de guetos territoriais associados à imigração, abrindo toda a cidade a todas as pessoas interessadas em nela viver e trabalhar."

Durante o festival, a companhia belga Laika apresentará o espectáculo Piknik Horrifik. No almoço realizado na Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa que serviu de apresentação, o artista Peter De Bie, sintetizou o que os espectadores poderão encontrar: um "happening" em que a influência do imaginário de Hieronymus Bosch é visível, e onde se convida à reflexão a partir de oposições como o Céu e o Inferno, a vida e a morte, a fome e a fartura.

Peter De Bie
No texto referente ao espectáculo, podemos ler:

"Aterrorizante, misterioso e, no entanto, iressestivelmente bonito, "O Jardim dos Prazeres Terrestres" de Hieronymus Bosch, é a sua obra mais fascinante. Bosch visualiza as suas ideias acerca da humanidade: criada à imagem de Deus, expulsa do Paraíso, inquisidora e hedonista por natureza e condenada a ser engolida pelas mandíbulas do Inferno.Uma visão de pesadelo desenhada para encorajar o homem a levar uma vida virtuosa. Quinhentos anos mais tarde, esta pintura ainda se mantém marcante.

Piknik Horrific é sobre a privação e a abundância. Sobre a privação que leva à fome e sobre a decadente superabundância que caracteriza a moderna sociedade ocidental. Enquanto antigamente os povos tendiam a sobrealimentar-se quando os tempos eram de abundância para compensar os anos de escassez, no presente não conhecemos o significado da escassez. A abundância de comida é aparentemente infindável e gasta com indiferença. Mas quando é que as nossas consciências começarão a protestar? E se a maré muda?

Laika transforma um local desolado num espaço de suprema felicidade, onde o espectador é tentado pelos prazeres terrenos. Esse idílio transforma-se seguidamente no jardim cornucópia, após o que o espectador é levado a um "picnic apocalíptico". Piknik Horrifik confunde-nos com uma abundância exuberante - a característica principal do trabalho de Bosch: imensa acção, imensas imagens e quantidades copiosas de comida e bebida..."

Do almoço servido, percebeu-se a intenção de jogar com a diferença entre expectativas e a realidade, entre falsas aparências e o concreto, entre a leitura prévia do nosso cérebro e a constatação feita pelos sentidos.

Jogo de máscaras, entre o que parece horrível e afinal sabe bem, entre a repulsa e a vontade de a vencer - e a recompensa obtida, e uma oportunidade para olhar com mais atenção para o outro, o estranho, o temido e poder vir a perceber que, afinal...

Fotografias sem legendas, para poderem divertir-se com a impressão saída do primeiro olhar e as constatações após uma observação mais demorada. Para mim foi divertido e esclarecedor.








Programa completo aqui.

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