Um retorno no Bistro do Ipsylon

Os retornos têm dias: há aqueles que se recebem com um encolher de ombros e um sorriso forçado, palavras de circunstância e gestos de favor - é assim a vida - e há os outros que merecem bandeirinhas e fanfarra, secretos abraços e peito inchado de satisfação, tempos de alegria, mundo justo, equilibrado e a crescer.

Também na restauração a regra se cumpre. Não falando dos primeiros, cumpre-me assinalar com enormíssimo prazer um pequeno regresso ao Ipsylon que tem tudo de grande: a reinstalação da oferta do em-tempos-crismado-cachocroute agora simples e lusitanamente chamado cachorro-de-salsicha-caseira-de-porco-preto-com-choucroute-mostarda-com-sementes-e-queijo-azul (cachocroute, mesmo escapando a ironia do nome, era tão mais bonito...).

Eu, que reservava um exemplar sempre que lhe visitava a esplanada, sempre que aquele azul ao longe e o sossego ao perto me chamava de saudades e que andei em campanha pelo desaparecido durante tanto tempo, limito-me a anunciar urbi et orbi o acontecimento.

Não sei de outra maneira para o definir que não seja porn food chic - pelas formas, pela sensualidade dos gostos fortes que o constituem e se vão revelando a cada dentada, pelas diversas texturas (o crocante, oh o crocante da crosta do pão, o líquido que escorre quando o revestimento da salsicha se rompe quando mordida, as sementes de mostarda), pelos cheiros. E não sei de outra maneira para o perceberem que não seja viajarem até ao Guincho e ávida e de-li-ci-a-da-men-te, perante os relvados, as dunas, os azuis, o vento o pedirem, trincarem, sugarem até ao desaparecimento final.

Acontecimento devidamente festejado num dia ideal, de tarde tranquila e boa conversa com o seu autor - o chefe Cyril Devilliers - e o acompanhamento, para fazer boca, de mais umas coisinhas fantásticas de simplicidade aparente e complexidade de gosto.