Novas (das) Migas de Mora: Pedro Sommer Ribeiro (I)


Mora (não Moura, não Amora: M-O-R-A). Vila capital do concelho, em terras de transição que parecem ribatejanas a quem se aproxima vindo de Coruche e alentejanas a quem viaja de Arraiolos. Há cinco anos que oficializa o seu amor de perdição pelas migas num evento que, apropriadamente, denomina "Mês das Migas" ao qual, este ano, decidiu acrescentar a presença de alguns cozinheiros de além. Troca de experiências, troca de visões, aprendizagem recíproca, sugestões para cardápios futuros e vôos diferentes - eis a ideia subjacente a esta vinda, patrocinada pela Câmara Municipal, alavanca desta e de muitas outras acções que dinamizam o concelho e lhe previnem o abandono anunciado pela prolongada indiferença dos centralistas litorâneos.

Que estas migas sejam um grito de revolta contra a tolerância alheada com que olhamos este interior túmido de delícias em desaparecimento.

Do Chefe Pedro Sommer Ribeiro se pode dizer que é um contemporâneo cozinheiro à antiga no que respeita ao seu relacionamento com a profissão e com o mundo. Sem funfuns nem gaitinhas, do seu trabalho resulta uma cozinha indiscutivelmente personalizada - com alma, com força, com impacto - que nos fala do autor, das suas vivências, do seu e nosso mundo. Não isentas de responsabilidade por este resultado estão tanto as suas experiências cosmopolitas nos hotéis Ritz de Lisboa e Dorchester de Londres, como os restaurantes por onde passou dos quais se destaca a que foi a sua primeira grande aventura como restaurador, o restaurante Sommer, de boa memória para os que o frequentaram. Homem de vários instrumentos - das aulas na Escola de Hotelaria e Turismo do Estoril à consultoria, da colaboração com revistas de especialidade ao catering - arribou a Mora com o firme propósito de ouvir, de deixar e aprender. De partilhar.


Foi no O António, há alguns anos, que tive a minha iniciação nas migas do concelho, levado pelo Nuno Paisana, tranquilo tecedor de amizades, eficaz parceiro da autarquia e amigo infelizmente partido. Na cozinha deste Rei das Bifanas (já provaram? quando por perto, parem e peçam duas), mora uma equipa que transporta das suas memórias para a mesa de quem a procura a tradição local e que, para além das bifanas e migas, nos tenta com uma sopa de cação e os petiscos caracteristicamente alentejanos, deixando-nos de bem com a decisão de aqui parar.




Como manda o bem fazer, os vinhos da Região são maioritários.

Para estas primeiras migas visitantes (para a noite viriam outras mas isso já é de outra história) teve o Chefe a ideia de as trabalhar com o pato, especificamente as patas, a gordura e a pele. Preparação a aliar a simplicidade da explicação, à experiência que determinou o equilíbrio de sabores e texturas: as tradicionais - as migas em si, feitas à maneira da casa, secas no tacho, com o sabor do alho -, com os mais inusitados sabores da carne da perna, da gordura com o seu gosto específico, cortada pelo sabor inconfundível dos poejos e, acrescentando variedade, o crocante dos torresmos da pele.


Cozidas as pernas lentamente na sua gordura, foram depois desfiadas e juntas à expectante gordura, já filtrada. Com o pão dormido já esfarelado fizeram-se as migas, juntando-se o preparado anterior, bem como o poejo e quantidade que o saber e o gosto determinaram.

A carne desfiada das pernas, a incorporar na gordura que ficou do confitado





As migas

Colocaram-se as peles de pato numa frigideira, levando-a a lume médio, até crocantes. Colocaram-se sobre papel absorvente, deixando-as secas. Esmigalharam-se, espalhando os pedaços sobre as migas.

A pele do pato, a fritar na sua gordura, até ser torresmo
E bem prontas ficaram.

O pratinho de prova
Em paralelo, iam as cozinheiras da casa - a D. Estela e a D. Nina -, tratando das migas da carta, sob o olhar curioso dos visitantes.

O cheiro das ervas - com os coentros à cabeça -, do alho a fritar no azeite, dos pimentos, dos enchidos a tostar, das belas febras a grelhar, da carne de alguidar e revoltoso mar de molho, ah, cozinha portuguesa, com certeza!





As migas a secar nos tachos

Trio de Migas: (da esquerda para a direita) de Coentros, de Espargos, de Pimentos.
Com carne de alguidar e choco frito. Nem primeiro se estranha - entranha-se desde o princípio.

Migas de batata


Toda a equipa do restaurante com o Chefe Pedro Sommer


E partimos, já o crepúsculo chegava, para o jantar, poucos metros acima.

Um grande abraço ao

Restaurante O António
Rua de São Pedro nº 51
7490-208 Mora
Telefone: 266 403 216​

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No último ano..