Tibetanos: os 40 são os novos 20


Em Lisboa, a comemoração do início do ano novo budista tibetano - o Losar - ocorreu no passado dia 16. Convidado a partilhar um almoço n' Os Tibetanos, o restaurante budista mais antigo da capital, pude ir um pouco mais além da superfície, que conhecia de passadas visitas (muito espaçadas deste presente). Foram duas horas de uma conversa muito interessante, pontuada por alguns dos mais emblemáticos pratos da carta que, inspirando-se em várias cozinhas nacionais, é uma das mais interessantes propostas vegetarianas da cidade.


Se quarenta anos, na experiência humana, é uma imensidão, na idade de um restaurante lisboeta é quase uma improbabilidade. Um espanto. Um desafio aos deuses sociais da novidade, da moda, do efémero. Mais espantosa e digna de efeméride se torna a belíssima idade quando o restaurante em causa se assume como guarda avançada de uma religião e de uma cultura ultra-minoritária neste país.

Senhoras e senhores, para quem não conhece, eis Os Tibetanos.





É um restaurante budista porque, na sua génese, esteve a comunidade budista de Lisboa da altura (que ainda tem a sua sede no edifício - no piso superior situam-se o Templo e a escola budista, com um centro de Yoga e Meditação, onde decorrem workshops e aulas de Yoga tibetano Lujong e meditação - e a sua propriedade), tendo criado o restaurante como forma de financiar a comunidade e rentabilizar o espaço, sendo durante muitos anos, quase caso único de restaurante vegetariano na cidade (incidentalmente: os budistas tibetanos não são obrigatoriamente vegetarianos, procurando, no entanto, manter uma ética de alimentação consonante com a sua filosofia de vida, de respeito pela natureza e por todas as formas de vida e, como tal, em casos de necessidade permitem o consumo de grandes animais - de modo a minimizar o número de mortes -, proibindo o consumo dos de menores dimensões, como peixes e pássaros), com o correspondente sucesso de frequência, principalmente nos anos 80 e 90, mantendo até à actualidade a sua crença e prática nos princípios que norteiam aquela religião.

Em 2010, com a dispersão da comunidade budista, formou-se uma nova equipa, com alguns dos membros anteriores e novos gestores, a qual acentuou gastronomicamente ainda mais o carácter budista e tibetano. Para além da diversificação dos recheios dos Momo (e os com recheio de espinafre e queijo são um sucesso), a preparação culinária mais disseminada no país, foram introduzidos novos pratos tibetanos, como o shab tra (em versão vegetariana), acrescentando influências e alguns pratos de outros países e latitudes como a Índia, África ou Brasil.

Nesta comemoração, não se poderia deixar de iniciar a refeição com o que será, gastronomicamente, o gesto simbólico mais importante, o de comer um khapse (ou khapsay), um bolinho frito, confeccionado com farinha, ovos, manteiga e açúcar, enrolado em vários formatos e que contém uma frase que pode servir de reflexão ou de mote para o ano vindouro.

Khapse

Khapse

Depois, ao correr da conversa com a Susana e um dos sócios, Paulo Bengala, uma sucessão de pratos interessantes, saborosos, demonstrativos de quão agradáveis podem ser as alternativas à santificada proteína animal que nos enche a cultura, desde que não obrigatórias ou alienadamente veneradas.

As entradas: da esquerda para a direita,   Ting Momos, Sha Paklé e Triângulos de queijo

Tingmos (com um twist de sabor português)

Sha Paklé (pastéis recheados com seitan e vegetais) e três molhos de acompanhamento

Os pratos principais: Caril de tofu, Shab tra de seitan e Momos vegetarianos

Caril de manga com tofu

Shab tra de seitan

Momos vegetarianos

Ficaram a faltar na fotografia as sobremesas, igualmente recomendáveis, destacando a tarte de papaia e requeijão.

Quarenta anos? Isso é o princípio da juventude. Venham mais quarenta, a nutrir os lisboetas com boas posturas e melhores sabores.

Os Tibetanos
Rua do Salitre, 117, Lisboa
Tel.: 21 314 20 38 ; 932 846 610

Comentários

Artur Hermenegildo disse…
Gosto muito desse restaurante.

Conheço o Paulo Bengala há 25 anos, fomos colegas na Andersen Consulting.

No último ano..